Geral
Na foto, Pastoral do Migrante, em Porto Alegre, com doações nos bancos da igreja
Crianças perdidas: menores gaúchos têm chegado em dezenas aos abrigos sem os responsáveis e reencontros com pais e mães emocionam
Conselheiros tutelares trabalham dia e noite para acolher e cuidar, enquanto combatem fake news
Em uma sequência de eventos catastróficos, o vídeo do reencontro de mãe e filhos mostrado ao GLOBO por uma integrante do Conselho Tutelar de Porto Alegre em seu celular é o oposto exato da dor. O abraço foi na quinta-feira (as identidades de responsáveis e crianças citadas nesta reportagem serão mantidas em sigilo). A mãe que explodia em esperança realizada havia sido resgatada no fim de semana em Eldorado do Sul, na Grande Porto Alegre, cidade de pouco mais de 40 mil habitantes submersa pela fúria climática. Ela só parou de chorar quando reencontrou o filho e a filha, de 9 e 6 anos após buscas e ingerências na Justiça.
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A história ilustra a complexidade de um aspecto dos esforços de resgate na Região Metropolitana de Porto Alegre: os menores de idade que chegam aos abrigos sem os responsáveis diretos. Por razões que podem ser estarem aos cuidados de um parente ou amigo ou mesmo sós em casa, realidade comum entre famílias em extrema vulnerabilidade social, quando foram resgatadas da cheia.
Abrigos no RS recebem crianças sem os responsáveis diretos
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No Centro de Triagem Geraldo Santana foi criada uma área específica para acolhimento de menores
Na terça-feira, a prefeitura anunciou a criação de uma área específica para acolhimento de menores no Centro de Triagem Geraldo Santana, no bairro de Santo Antônio, onde O GLOBO conversou com três conselheiras. O anúncio foi feito pela promotora de Justiça da Infância e da Juventude do Ministério Público de Porto Alegre, Cinara Braga, à Radio Gaúcha:
— Cadastramos todas as crianças desacompanhadas. Essas crianças devem ser encaminhadas para lá, onde é possível fazer uma busca ativa pelo responsável — explicou.
No local há plantão 24h de conselheiros tutelares, com atendimento por psicólogos e assistentes sociais. No caso da família que se separou por cinco dias, a guarda das crianças era do pai, que morreu por causa das chuvas. Passou então para a avó paterna, que, por sua vez, se recusava a sair de casa em uma área de risco.
Foi preciso que o Conselho Tutelar acionasse uma juíza, que então constatou com a Defesa Civil o perigo de vida das crianças. Mas elas não sabiam onde a mãe estava. E como não há abrigos na submersa Eldorado, todas foram para Porto Alegre, mas em endereços diferentes. O deslocamento para outro município atrasou ainda mais o reencontro.
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Em outro caso resolvido na quinta-feira, duas crianças foram passar o fim de semana passado com o pai para visita determinada pela Justiça. Os responsáveis são legalmente separados e dividem a guarda dos filhos. Mas ele se recusava a sair de casa, mesmo com a água subindo em direção ao apartamento de piso baixo. Com a ajuda do Ministério Público foi feita uma busca e apreensão. O reencontro com a mãe não foi menos feliz.
Há outras complicações. Como no caso do avô que não quis receber a neta, após o esforço de Prefeitura de Porto Alegre, do Conselho Tutelar e do Ministério Público de encontrá-lo. O avô argumentou estar sem água em casa e com a mulher doente. Durante uma tarde inteira, a conselheira Salete Alminhana, formada em Direito e assistente social, ficou com as crianças, dirigindo abrigo a abrigo, até encontraram a avó da menina, acolhida em outra unidade, que a recebeu com carinho.
— Há também muitos casos de fake news, inclusive em que fotos de crianças de fato desaparecidas aparecem nas redes sociais em situações inventadas. Nos últimos dias, muitas vezes tivemos de ir a locais onde histórias dadas como fatos não se confirmaram — diz a conselheira.
Uma das mentiras mais maldosas foi a de uma bebê de 17 dias que estaria sozinha em um alojamento. A comunidade local se mobilizou. Mas o Conselho Tutelar não a encontrou lá. A bebê reapareceu nas redes no dia seguinte, como estando em outro local, no Morro Santana. De novo, nada. Na quarta, ela não só estaria em uma escola em outro canto da cidade, como sendo amamentada por várias mães. Falso.
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Outra fake news garantia que 40 crianças haviam sido resgatadas em um bote na Zona Norte de Porto Alegre na quarta-feira. Treze equipes de reportagem vieram à unidade, inclusive a imprensa internacional. Elas jamais apareceram.
O desespero, a ausência de orientação clara e o número de voluntários bem intencionados mas sem preparo como socorristas, sublinham as conselheiras, têm sido complicadores. Em muitos resgates, contam, crianças são “salvas primeiro”, mas entregues nos abrigos de modo desorganizado. E a falta de um cadastro unificado e digitalizado transforma o reencontro com os responsáveis em terrível gincana.
— A maior dificuldade é a ausência de lista oficial de resgatados. Por conta da dimensão da tragédia, locais de recolhimentos e abrigos são abertos a cada duas horas hoje na Grande Porto Alegre — diz a pedagoga Alice Goulart, coordenadora do Conselho Tutelar.
No número (51) 991581348, os conselheiros recebem denúncias sobre resgates ou nos acolhimentos. Em uma semana, houve uma suspeita de abuso sexual de uma menina em um dos abrigos, feita na quarta-feira. Ela e a mãe negavam a violência, mas o caso foi levado para o Centro de Referência em Atendimento Infanto-Juvenil para Crianças Vítimas de Assédio Sexual. Após a avaliação, chegou-se à conclusão que não houve abuso.
— Todas as denúncias, mesmo com as negativas, são analisadas cuidadosamente, especialmente por serem espaços em que não há área separada para crianças e adolescentes. Daí a importância de termos esse espaço específico no Centro de Triagem — diz Alice Goulart.
Desde o início das chuvas, 12 crianças passaram pela unidade e duas delas ainda não haviam se reencontrado com os pais. Uma é um adolescente com transtorno do espectro autista que chegou na noite de domingo do Humaitá, um dos bairros mais destruídos pelo debacle climático de Porto Alegre. As conselheiras seguem buscando a família do menino.
* Enviado especial ao Rio Grande do Sul
Por Eduardo Graça — Porto Alegre
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12 de maio de 2024 no 04:21
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