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Copa Africana de Nações, começaram a desembarcar na África as principais estrelas do futebol continental.

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Reação europeia à realização da Copa Africana de Nações resvala no desrespeito

Apesar da contrariedade dos clubes da Europa e do cinismo de suas críticas, o torneio de seleções africanas começa no próximo domingo.

Faltando poucos dias para o início da Copa Africana de Nações, começaram a desembarcar na África as principais estrelas do futebol continental. Em um vídeo que circulou pelos ares da internet, o senegalês Sadio Mané aparecia bailando suavemente após sua chegada — em nenhuma fibra do corpo aparentava preocupação com a opinião do Liverpool sobre a realização da competição em meio à temporada europeia. O torneio africano de seleções, quem tem sede em Camarões e reúne 24 países, começa no próximo domingo e se estende até 6 de fevereiro.

Por questão de tradição, a Copa Africana sempre aconteceu em janeiro. A edição de 2019, no Egito, ocorreu na metade do ano, verão no hemisfério norte, e a intenção era que assim seguisse — especialmente para se adaptar ao calendário europeu. Camarões alegou que junho e julho sempre reservam fortes chuvas ao país — até vinte dias ininterruptos de aguaceiro –, então essa edição, que ainda se refere a 2021, seria realizada novamente no início do ano passado. Com a pandemia instalada, os torneios de seleções da América do Sul e da Europa foram postergados de 2020 para meados de 2021, e a Copa Africana encaixou-se como pôde nesta conturbada distribuição de competições.

Entre os clubes europeus, como é costume, houve gritaria pela necessidade de ceder seus jogadores justamente em rodadas decisivas de suas competições domésticas. É óbvio que a questão do calendário futebolístico é importante, mas os europeus desenvolveram esse misterioso hábito de acreditar que o seu calendário é uma imposição quase divina — como se no hemisfério sul, por exemplo, devêssemos adiar nossa farofeira y redentora viagem rumo a uma praia de suspeita beleza apenas porque Crystal Palace e Everton precisam jogar um dia depois do Natal.

Na metade de dezembro, justamente quando a variante Ômicron já começava a se alastrar, os clubes da Europa assinaram uma carta em que se mostravam profundamente preocupados com a realização da Copa Africana, pois, entre outros motivos, seus jogadores estariam expostos a duvidosos protocolos sanitários. Percebam a petulância. Há poucos meses, as condições pandêmicas andavam menos dramáticas, mas bastante longe de um desfecho, quando a Eurocopa foi disputada com estádios cheios, em diversas cidades. Aliás, não foi em nenhuma copa sul-americana ou africana que duas seleções foram obrigadas a voltar a campo após um jogador, no caso o dinamarquês Christian Eriksen, praticamente ter morrido no gramado.

O cinismo das restrições europeias torna-se ainda mais evidente ao vermos as notícias dos surtos de Covid-19 que suplantam alguns dos elencos mais caros do mundo, sem que nenhum jogador tivesse sequer chegado perto de algum aeroporto da África — seria justo dizer, nesse caso, que hoje também os europeus são um risco às condições sanitárias em solo africano (em questões humanitárias, sempre foram). Com tantos infectados, Liverpool e Bayern, por exemplo, chegaram a pedir o adiamento de seus jogos — a variante europeia do lateral hábil como um hidrante fez o futebol do Velho Continente ficar em isolamento estético durante quase um século.

A questão dos europeus, portanto, tem menos a ver com comprometimento sanitário do que com uma nada surpreendente visão de mundo baseada em menosprezo e desrespeito, que flerta de maneira incisiva com o preconceito. Se todos os torneios do mundo, nos últimos dois anos, foram disputados em condições anormais, meio remendados e improvisados, sem graça e sem torcida, não seria a Copa Africana a esperar que o verdejante mundo anterior retornasse. Nesse sentido se manifestou, há poucos dias, o marfinense Sebastián Heller, atacante do Ajax, contrariado quando lhe perguntaram se preferia permanecer no clube ou defender a sua seleção: “Isso seria perguntado a um jogador europeu?”. Assim também se manifestou Sadio Mané, mas dançando — e dançando como dançam apenas os que estavam com saudade de casa.

Footer blog Meia Encarnada Douglas Ceconello — Foto: Arte

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Por Douglas Ceconello

ge.globo — Porto Alegre / Foto: Federação de Futebol de Comores

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