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Os apostadores também utilizavam dois sites diferentes: o Bet365 e a Betano.

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Máfia das apostas: veja passo a passo como suspeitos ganharam mais de R$ 700 mil em uma rodada do Brasileirão

Busca e escolha de jogadores, diversificação de sites e múltiplas contas e bets faziam parte da estratégia

Esquema de manipulação de apostas afeta partidas do Brasileirão
Esquema de manipulação de apostas afeta partidas do Brasileirão Editoria de Arte

“Pra vocês fazerem um quadro aí”, escreve Thiago Chambó, um dos suspeitos de participar do grupo que aliciava atletas para manipular jogos do Brasileirão. Em seguida, ele envia um print de uma aposta múltipla feita em cinco jogos da 25ª rodada do Brasileirão de 2022. Investimento de R$ 175, lucro de mais de R$ 43 mil. Apesar de chamarem a atenção, tanto os gastos quanto os retornos foram maiores. Era só para ser um símbolo do esquema. E a forma como o grupo conseguiu não foi digna de se orgulhar, nem pendurar em um quadro.

Apostador envia um print de uma aposta múltipla — Foto: Reprodução

Apostador envia um print de uma aposta múltipla — Foto: Reprodução

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Ao todo, o lucro naquela rodada para o grupo foi de R$ 730.616,00 segundo conta do próprio Thiago, divulgada no grupo dos apostadores em conversas que constam no processo criminal do Ministério Público de Goiás. Os valores contam apenas o que foi operado nos sites. O gasto com os seis jogadores supostamente aliciados, nesta rodada, foi de R$ 260 mil. No total, a operação, em um fim de semana do Campeonato Brasileiro, teria um lucro líquido de R$ 470 mil. Veja passo a passo como era feita a operação:

1. Busca e formação do grupo de jogadores

Durante a semana antes da rodada do Brasileirão, os apostadores buscavam jogadores que topassem tomar um cartão amarelo em troca de uma quantia em dinheiro. Com alguns contatos já disponíveis, eles procuravam variar jogos, equipes e atletas, priorizando aqueles que as casas de aposta classificassem com uma odd alta. Ou seja, quanto mais a casa pagava por um amarelo para um atleta específico, mais ele era visado. Jogadores com risco de não ser titular eram preteridos.

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Para a 25ª rodada do Brasileirão, quando conseguiram faturar mais de R$ 700 mil nas apostas, seis jogadores foram aliciados, segundo as conversas de Whatsapp do grupo que constam no processo do Ministério Público de Goiás: Nino Paraíba (Ceará), Diego Porfírio (Coritiba), Vitor Mendes (Juventude), Alef Manga (Coritiba) e Bryan Garcia (Athletico). Todos eles são apenas citados no processo, mas não foram denunciados.

Apostador confirmando os nomes que vão receber os cartões — Foto: Reprodução

Apostador confirmando os nomes que vão receber os cartões — Foto: Reprodução

2. Pagamento do sinal

Para garantir que os jogadores cumprissem o acordo,um pagamento adiantado era oferecido. Cada um, segundo o documento, recebeu R$ 50 mil nesta rodada, com exceção de Nino, que, por estar com odd mais alta, recebeu R$ 60 mil. Todos teriam recebidos sinais que variavam entre R$ 10 mil e R$ 35 mil, segundo o relato e contabilidade do grupo.

Veja imagens da operação que prendeu envolvidos em manipulação de resultados no Brasileirão Série A

MP cumpre mandados de prisão contra envolvidos em manipulação de resultados — Foto: Divulgação/MPGO
MP cumpre mandados de prisão contra envolvidos em manipulação de resultados — Foto: Divulgação/MPGO

6 fotos

MP cumpre mandados de prisão contra envolvidos em manipulação de resultados — Foto: Divulgação/MPGO

Jogadores profissionais cooptados receberiam valores entre R$ 50 mil a R$ 100 mil

3. Hora da aposta: CPFs diferentes, dois sites, várias bets

Parte importante da estratégia dos suspeitos era como fazer as apostas nos sites. Em vez de jogarem todo o valor investido em uma só conta, eles abriam mais de 30, com CPFs diferentes, fazendo apostas menores. Isso é especialmente importante para não chamar a atenção e para que os sites não bloqueiem uma aposta muito alta.

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Para isso, os apostadores também utilizavam dois sites diferentes: o Bet365 e a Betano. Na 25ª rodada, por exemplo, foram feitas pelo grupo quase 40 apostas diferentes, todas envolvendo cartão amarelo para os jogadores supostamente aliciados. Os valores de cada aposta eram de, no máximo, R$ 200. Ao todo, porém, o valor investido só nas bets nos sites foi de R$ 8.430. O retorno, após as apostas darem “green” (vencerem), foi de mais de R$ 700 mil.

4. Apostas múltiplas

Os apostadores só faziam apostas múltiplas, ou seja, aquelas em que mais de uma situação é colocada em jogo, e, por isso, ficam mais valiosas e pagam mais. No caso, os suspeitos apostaram que, naquela rodada, todos os seis jogadores supostamente aliciados tomariam cartão. Como a aposta era múltipla, ela era mais arriscada: se algum jogador falhasse, toda a aposta seria perdida. Por outro lado, os lucros eram multiplicados.

Apostas realizadas pelos apostadores — Foto: Reprodução

Apostas realizadas pelos apostadores — Foto: Reprodução

5. Risco calculado e necessário

Mas os apostadores também se arriscavam e apostavam no resultado da partida, somando ainda mais valor à aposta múltipla com os cartões. Não era por adrenalina. Além de disfarçar uma aposta certeira — que poderia ser vista com desconfiança por não conter nada além de vários jogadores recebendo cartão amarelo —, apostar em um resultado direto aumenta liquidez das bets. Apostando também em um resultado do jogo, uma variável mais incontrolável, a casa de aposta permite investir valores maiores, com odds mais altas e lucros maiores.

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Mas eles se protegiam: com tantas apostas em dois sites diferentes, variavam as operações. Apostavam em dupla possibilidade. No caso da 25ª rodada, escolheram a partida Santos x Goiás para isso. Faziam uma parte das bets com a opção de vitória do Santos ou empate. Outra parte com vitória do Santos ou do Goiás. E uma terceira com vitória do Goiás ou empate. Um dos três grupos de apostas daria “red”, ou aposta perdida, com o valor indo para a casa, mas o restante, com as odd altíssimas, compensaria os suspeitos.

Risco calculado dos apostadores — Foto: Reprodução

Risco calculado dos apostadores — Foto: Reprodução

Veja jogadores denunciados na Operação Penalidade Máxima II

O zagueiro Victor Ramos, da Chapecoense, é um dos alvos da Operação Penalidade Máxima II — Foto: Reprodução/Instagram
Kevin Lomónaco, zagueiro do Bragantino — Foto: Ari Ferreira/Red Bull Bragantino

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Apresentação do jogador Igor Cariús — Foto: Rafael Bandeira / SCR

O Ministério Público de Goiás (MP-GO) segue revelando mais camadas do esquema de manipulação de resultados em partidas de futebol no país

6. Recebimento e pagamento

Após o esquema dar certo, a contabilidade era feita e o dinheiro era sacado aos poucos dos sites de aposta, que não permitiam todo o saque de uma vez e demoravam alguns dias para pagar. Por isso, o quitamento com os jogadores supostamente aliciados era lento, o que gerava cobranças. Parte do dinheiro era distribuída entre os suspeitos e o restante, usado como investimento para a próxima rodada.

Um dos suspeitos aponta quanto falta pagar para cada jogador — Foto: Reprodução

Um dos suspeitos aponta quanto falta pagar para cada jogador — Foto: Reprodução

Apostador conversa com Vitor Mendes para pagar o restante do acordo — Foto: Reprodução

Apostador conversa com Vitor Mendes para pagar o restante do acordo — Foto: Reprodução

Por Rafael Soares e Thales Machado

OGlobo.globo.com

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