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Assessor especial da Presidência, Amorim, e presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, durante evento em Caracas

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Dívida de US$ 1 bi com Brasil: ‘Foi mais que devo, não nego. Foi devo e quero pagar’, diz Amorim após reunião com Maduro

Assessor Especial de Lula conversou com dirigentes da oposição e acredita que o Brasil terá um papel no processo político e eleitoral na Venezuela em 2024

Depois de organizar discretamente uma visita oficial à Venezuela — sobre a qual pouquíssimas pessoas no governo foram informadas —, na última quarta-feira, o Assessor Especial da Presidência da República Celso Amorim se mostra satisfeito com o resultado.

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Na conversa que manteve com o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, falou-se sobre democracia, relações bilaterais e temas pendentes, entre eles uma dívida de US$ 1 bilhão que a Venezuela acumula com o Brasil— e que deixou de pagar em 2017. Sobre essa questão, a resposta do chefe de Estado venezuelano foi, segundo contou Amorim ao GLOBO, “um pouco mais do que ‘devo, não nego, pagarei quando puder’. Foi um devo e quero pagar”.

O Assessor Especial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva conversou com dirigentes da oposição e acredita que o Brasil, naturalmente, terá um papel no processo político e eleitoral que está se desenhando para as presidenciais de 2024. Amorim também defendeu a posição crítica do Brasil sobre a atuação do governo de Daniel Ortega na Nicarágua, e a cruzada de Lula para que o mundo comece a falar mais em paz e negociação, quando se discute a guerra na Ucrânia.

Como foi a primeira visita a Caracas, nessa retomada das relações bilaterais? O senhor levou um recado do presidente Lula?

Foi uma visita muito tranquila, que durou pouco mais de uma hora. Os primeiros 40 minutos, ou uma boa parte, fiquei sozinho com Maduro e destaquei a importância que damos ao relacionamento com a Venezuela, a normalização, a volta da cooperação e também a importância que damos ao processo democrático que está se desenhando lá. Fiz questão de estar com a oposição, os principais grupos, entre eles o que chamam de G-4. É um grupo grande, que congrega [Henrique] Capriles, entre outros, e representa a oposição no diálogo patrocinado pela Noruega, que tem sede no México.

Foi expressado o desejo de que o Brasil tenha alguma participação nessa iniciativa de diálogo?

O Brasil terá inevitavelmente alguma participação pela proximidade, facilidade e pelo interesse que todos têm em dialogar com o país. Não sei se cabe, é uma coisa a examinar, que o Brasil entre formalmente como amigo de um lado. Hoje temos a Holanda, de um lado, e do outro lado a Rússia. Acho que o Brasil certamente será um ator importante, reconhecido, de todos os que conversei ouvi agradecimentos pela visita. Tenho experiência em diálogos, em 2003 criamos o Grupo de Amigos, e naquele momento o diálogo com a oposição [venezuelana] era muito tenso. Dessa vez não, foi tranquilo, sincero. Iremos seguindo, vendo o que nos pedem, o que desejam.

Em sua conversa com Maduro foi colocado o quanto é importante para o Brasil que as eleições presidenciais de 2024 sejam democráticas e que confirmem uma recuperação plena da democracia no país?

Coloquei, não de maneira que parecesse que eu estava colocando em dúvida que isso ocorra. Ele [Maduro] sabia que eu encontraria a oposição, não foi uma coisa escondida. Isso estava o tempo todo implícito, e usei claramente a palavra democracia.

A dívida que a Venezuela tem com o Brasil, de cerca de US$ 1 bilhão, foi mencionada na conversa?

Mencionei também, e Maduro se comprometeu a equacionar a questão da dívida. Claro que não vão pagar tudo de uma vez. Foi um pouco mais do que ‘devo, não nego, pagarei quando puder’. Foi um devo e quero pagar. Não houve conversa sobre isso com o governo Bolsonaro que, aliás, queria que eles não pagassem para usar isso. Acho que será pago normalmente.

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O senhor foi a Caracas na mesma semana em que o Brasil se posicionou sobre a situação na Nicarágua…

As situações são bem diferentes. Visitei muitos desses países, em muitas situações, com presidentes, sem presidentes, e achei o clima na Venezuela muito tranquilo. As pessoas falam abertamente, sem medo, gente jovem, de partidos novos.

Sim, mas, ao mesmo tempo, a imprensa crítica desapareceu…

Não vou negar, é outra questão.

Voltando a Nicarágua, qual a importância da declaração do Brasil no âmbito da ONU?

O Brasil mostrou que tem uma posição clara, uma forte preocupação com a violação dos direitos humanos, ficou absolutamente chocado com a desnacionalização de pessoas, os apátridas, e se manifestou. Mas o Brasil não vai apoiar sanções, não vai entrar em grupos pré-organizados com objetivos ideológicos, respiramos o pluralismo. O pronunciamento do embaixador [do Brasil na ONU em Genebra,] Tovar [da Silva Nunes] foi nítido e claro.

O Brasil vai tentar uma aproximação com o governo de Daniel Ortega?

O Brasil ajudará no que puder ajudar. Mas só se ajuda quem quer ser ajudado. Mas, se ele não quiser ajuda, não vamos patrocinar invasões, sanções que só atingem a população, é contra nossa visão.

Existe uma vítima brasileira da repressão na Nicarágua…

Sim, isso tem de ser apurado.

Bom, vamos à guerra…

Vamos à paz (risos).

O telefonema entre Lula e Zelensky foi um divisor de águas na posição brasileira? Mudou alguma coisa?

O que mudou bastante, e não posso atribuir ao presidente Lula, não tenho essa pretensão, mas depois que o presidente começou a falar de paz muita gente fala de paz. A própria resolução da ONU, que tem um parágrafo que eu não gosto muito, porque torna mais difícil a negociação, está voltada para a paz. É primeira vez que isso acontece, e a proposta específica brasileira foi falar em cesse de hostilidades. O simples fato de que as pessoas tenham passado a pensar não apenas em como ganhar a guerra, mas também em como obter a paz, já é um grande ganho para as posições que o presidente Lula tem defendido. Nosso objetivo não é agradar aos Estados Unidos, a União Europeia, nem a Rússia, nem a China. O telefonema para o Zelensky foi importante, porque mostrou que falamos com todo mundo, mas divisor de águas… não sei.

Se comentava muito sobre um olhar crítico do governo Lula sobre a imagem de Zelensky como um herói, que promovem europeus e americanos…

Vamos deixar impressões pessoais de lado. Foi uma conversa positiva, política, respeitosa, ele não reclamou de nada e colocou as questões dele. Foi dito que condenamos a guerra, o uso da força, a quebra do princípio da integridade territorial dos Estados, mas somos a favor da paz. E paz tem que ter negociação.

E concessões dos dois lados?

Negociação é negociação. Por que senão, qual é o objetivo, destruir a Rússia? Outros já tentaram, Napoleão tentou, Hitler tentou, deu no que deu, sempre. A Rússia, mesmo desfeita de tudo o que tinha antes, do Império do Czar… é um país com 11 fusos horários, e um grande número de nacionalidades. O que se quer fazer, desintegrar isso tudo? Primeiro, os russos não vão deixar. É preciso encontrar uma negociação. O que está errado, está errado, agora temos de descobrir e discutir uma maneira que permita ter paz.

Zelensky pediu ao Brasil que articule um encontro, talvez uma cúpula, de presidentes latino-americanos com a Ucrânia. É possível?

Organizar uma cúpula para um líder específico acho que não seria uma coisa muito adequada. Ainda que não chegou o momento para esse tipo de coisas, ainda temos de conversar mais. Para pensar em paz, é preciso entender os pontos de resistência, de um lado e de outro. Mesmo que se condenem o uso da força e a quebra do princípio da integridade territorial dos estados, não quer dizer que você não compreenda preocupações de segurança. Tem uma aula dada para a BBC por talvez o maior historiador britânico, Arnold Toybi, chamada “A Rússia e o Ocidente”. Ele não era comunista, não gostava da União Soviética, e dizia que a Rússia tem suas razões para ter preocupações com o Ocidente. Isso foi em 1952. É preciso ter uma compreensão disso, não se trata de dar a razão. Temos de entender, para encontrar uma solução com base no direito internacional, reconhecendo realidades.

A guerra estará na pauta da visita a China?

O presidente Lula não irá lá com esse objetivo. Temos uma parceria estratégica, que, na prática, vem da época do governo Sarney. Hoje a China absorve um percentual enorme das nossas exportações, quase três vezes o que exportamos para os EUA, então é um país de grande importância para o Brasil, para o nosso agronegócio. Teremos muitos temas. Pensar como podemos fazer o que pode ser importante para o mundo, por exemplo, em matéria de mudanças climáticas. Existe um potencial de complementariedade importante. Queremos trabalhar juntos.

Mas se falará sobre guerra…

São dois grandes líderes, que representam dois dos três maiores países em desenvolvimento, é natural que o tema da guerra, que interessa ao mundo, estará na agenda. Pode acontecer qualquer coisa, como sabemos.

Inclusive virar um conflito nuclear…

É um risco. A China foi clara em dizer que armas nucleares não devem ser usadas. É perigoso.

A China apresentou uma proposta de paz, qual foi a avaliação do Brasil?

O movimento é importante, porque marca um desejo de envolvimento da China no processo. E a China é um ator importante, porque não adianta ter amigos só de um lado. A menos que você queira destruir.

Na ONU, a China se absteve…

É primeira resolução cujo tom principal é a paz. Aceitaram propostas brasileiras sobre a cessação de hostilidades. Tem um parágrafo que pode ser interpretado como algo que crie uma condicionalidade, e acho que, para começar uma conversa de paz, não se pode ter muita condicionalidade. Por isso o Brasil votou a fazer.

A volta de Lula ao poder criou a expectativa de relançamento da Unasul, mas a região vive momentos conturbados. Foi exagerada a expectativa?

A região está complicada em alguns aspectos, em outros está melhorando, como acho que é o caso da Venezuela, mas a Unasul sempre foi plural. Temos de saber lidar com os problemas. Pode haver coisas informais, aproveitar reuniões do Mercosul. Basta querer, fazer um convite. Além da região, o mundo está complicado. As demandas sobre o Lula são enormes, ainda não fizemos nada com a África. Haverá relançamento [da Unasul], vamos fazendo, vendo questões jurídicas. Não houve tempo de parar e ver isso.

Por Janaina Figueiredo — Brasília

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