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Economia

Presidente Lula durante lançamento do programa Mãos à Obra, no último dia 10

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Viagem de Lula à China inclui fundo de R$ 20 bi e visita à fábrica da Huawei, que pode gerar mal-estar com EUA

Brasil propôs declaração conjunta sobre mudanças climáticas, que prevê um fundo de financiamento, e quer falar sobre paz na Ucrânia; preocupação do governo brasileiro é manter equilíbrio entre China e EUA

A visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à China, na próxima semana, terá uma agenda muito mais ambiciosa da que ele teve em sua viagem aos EUA, em fevereiro, e incluirá, segundo O GLOBO apurou, atividades que poderiam gerar mal-estar no governo de Joe Biden — entre elas uma visita à gigante tecnológica Huawei, considerada, desde 2021, um risco de segurança pelas autoridades americanas por suspeita de usar seus equipamentos para espionagem. A viagem ao gigante asiático, apenas um mês e meio após Lula visitar os EUA, bem no início do governo, é uma medida da importância que ele dá a ambos — os maiores parceiros comerciais do Brasil— e, no governo brasileiro, a preocupação é manter o equilíbrio na disputa entre as duas superpotências por hegemonia.

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A visita à Huawei surgiu por um convite da empresa chinesa, segundo confirmaram fontes ligadas a ela — presente há mais de 20 anos no Brasil — que foi aceito pelo governo brasileiro. Nas últimas semanas, Brasília e Pequim trabalharam intensamente para elaborar uma lista que poderia chegar a 30 acordos bilaterais. Não está claro quais serão anunciados na viagem, e quais continuarão sendo negociados nas semanas seguintes.

Segundo fontes oficiais brasileiras, Brasil e China podem ativar um fundo de financiamento chinês de R$ 20 bilhões; o Brasil pode entrar na lista de países prioritários ao turismo do gigante asiático; os dois países selarão um entendimento para desenvolver a sexta geração de satélite sino-brasileiro; e, por iniciativa do governo Lula, poderia haver uma declaração conjunta sobre clima, que seria a base de um acordo bilateral de cooperação, articulação em foros internacionais e até mesmo criação de um fundo de financiamento binacional para combater mudanças climáticas.

— Visitar a Huawei pode gerar uma percepção negativa nos EUA, no governo Biden e no Congresso americano. Acho uma provocação desnecessária — afirma Eduardo Viola, professor de Relações Internacionais do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), e professor da Escola de Relações Internacionais da FGV.

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Para Viola, “o Brasil precisa ser cuidadoso”.

— Nesta nova Guerra Fria, em termos de valores, porque estamos falando, também, de um confronto entre democracias e autocracias, o Brasil está mais próximo dos EUA e da Europa. Mas, do ponto de vista comercial, temos um vínculo forte, e uma dependência da China. Chineses e americanos precisam reconhecer isso, e o Brasil precisa ser mais sensível às preocupações dos dois lados — aponta o professor, lembrando que EUA e países europeus foram “decisivos na defesa da democracia brasileira”.

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Outros analistas discordam de Viola. Na visão de Hussein Kalout, pesquisador da Universidade Harvard, “o Brasil é independente para perseguir seus interesses com quaisquer atores que julgar apropriados para o interesse nacional”.

— O Brasil não pode cair na armadilha de uma escolha binária — frisa Kalout.

Empresa à frente da tecnologia de telecomunicações 5G, a Huawei foi incluída em 2021, por decisão da Comissão Federal de Comunicação dos EUA, em uma lista de cinco firmas tecnológicas chinesas consideradas um “risco inaceitável” à segurança nacional americana. Em agosto de 2021, o assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, em visita a Brasília, chegou a pressionar o governo brasileiro a vetar a Huawei no leilão da tecnologia 5G no país.

A visita à empresa é vista pelo embaixador Rubens Barbosa, chefe da sede diplomática em Washington de 1999 a 2004, como “o que se espera que o Brasil faça”.

— A posição do governo é coerente com nossa tradição — afirma Barbosa.

A visita de Lula à China adquiriu uma dimensão amplamente superior à de sua rápida passagem por Washington, que não teve caráter de visita de Estado. A ida à fábrica da Huawei foi uma proposta da empresa chinesa, que busca, claramente, enviar uma mensagem política ao governo americano. Nos EUA, Lula não participou de encontros com empresários, e sua delegação foi muito menor.

Segundo fontes do governo, o presidente pretende conversar com o chefe de Estado chinês, Xi Jinping, sobre diversos temas, com destaque para a guerra na Ucrânia. Lula tem enorme interesse em falar com Xi sobre a criação de um grupo de países que possam contribuir para a busca da paz entre Rússia e Ucrânia. Sobre as tensões com os EUA, o recado será claro, confirmou a mesma fonte: “o Brasil não escolherá um dos lados [EUA ou China], e manterá sua política universalista, sem fazer opções de Guerra Fria”.

Fundo de R$ 20 bi e satélite

A ativação do fundo de R$ 20 bilhões do Banco de Desenvolvimento da China — um acordo com o BNDES de 2015 que nunca saiu do papel — também avança, segundo as mesmas fontes, e as conversas estão sendo comandadas pelo Ministério da Fazenda. Existe a disposição do lado chinês para destravar os recursos, que serão usados para investimentos em reconversão produtiva, explicou uma fonte.

Também está sendo preparado um acordo que prevê, segundo uma fonte diplomática, o desenvolvimento da sexta geração de satélite sino-brasileiro, iniciativa que começou da década de 1980. O novo satélite seria usado, entre outras coisas, para monitorar o desmatamento na Amazônia. O futuro satélite, acrescentou a fonte, terá capacidade para operar em condições de clima nublado, o que é um avanço em relação ao que temos hoje.

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O Brasil também deve ser incluído numa lista de destinos recomendados pelo governo da China, o que poderia estimular a viagem de chineses ao Brasil. Em 2018, chegaram ao país, segundo dados oficiais, 56.333 turistas chineses. No ano seguinte, o último antes da pandemia, o número chegou a 68.578. Não há estimativas sobre como este acordo poderia incrementar o número de turistas chineses no Brasil. Em 16 de março, o Ministério de Cultura e Turismo chinês anunciou que novos países foram incorporados à lista de destinos recomendados para viagens em grupo, junto com outros, como Portugal.

Veículos elétricos na Bahia

A proposta de uma declaração sobre clima partiu do Brasil nos últimos dias, e está sendo analisada por Pequim. A ideia é que os dois países trabalhem juntos, articulando posições em conferências internacionais no âmbito da ONU, atuando em iniciativas de reindustrialização verde, e criando um fundo binacional.

Outro dos esperados anúncios na visita de Lula é a compra por parte da montadora chinesa BYD de uma antiga fábrica da Ford em Camaçari, na Bahia, para produzir veículos elétricos. O grupo chinês já assinou um protocolo de intenções com o governo da Bahia para a produção local de veículos elétricos e híbridos, chassis de caminhões eletrificados e beneficiamento de lítio, matéria-prima para baterias. Segundo fontes próximas às negociações, o acordo está “praticamente fechado”, e Lula deve receber em Pequim representantes da empresa, que confirmou o avanço nas tratativas.

A pauta da viagem também poderia incluir um futuro acordo entre China e Mercosul. O Uruguai vem conversando com Pequim sobre um eventual acordo bilateral, o que causaria uma crise no Mercosul. O Brasil, confirmou uma fonte que acompanha as conversas, preferia um acordo do bloco com a China.

Por Janaína Figueiredo — Buenos Aires

Ge.globo.com

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