Esporte
Sob o comando de Enderson, Botafogo conquista o título da Série B
De desacreditado a campeão com uma rodada de antecedência: a Série B do Botafogo
Na segunda divisão mais difícil de todos os tempos, time começa mal, mas chegada de Enderson Moreira muda os rumos da temporada e embala o Botafogo
Era 21h35 de 20 de julho de 2021. Sem técnico há dois jogos, tendo acabado de perder para o Goiás por 2 a 0 e na 14ª colocação com um jogo a menos, o Botafogo resolve anunciar nas redes sociais que Enderson Moreira seria o novo técnico do clube. A imensa maioria das reações na página é de desaprovação com o nome escolhido pela diretoria para colocar o time de volta no caminho para a Série A.
Enquanto você lia o primeiro parágrafo já sabia o que tinha acontecido com o time que estava mais perto da zona de rebaixamento do que do G-4. A esperança da torcida parecia pouca, mas Enderson Moreira mudou o jeito do Botafogo gradativamente. Se não apresentava o futebol mais vistoso, os resultados eram mais do que suficientes para inflar a combalida moral alvinegra que vinha em baixa desde a temporada anterior.
Mas a Série B do Botafogo não começa com a chegada de Enderson Moreira. A caminhada na competição tem início assim que a diretoria anuncia a contratação de outro treinador: Marcelo Chamusca. Respaldado nas campanhas anteriores que fez com que subisse em todas as divisões nacionais, o ex-técnico acumulava mais esperança na torcida alvinegra.
A má campanha no Campeonato Carioca e a eliminação precoce na Copa do Brasil quase fizeram com que o treinador nem começasse a Série B no Botafogo. A diretoria deu um voto de confiança e Chamusca iniciou a competição à frente da equipe, mas a esperança que gerou na contratação já não era a mesma antes do torneio. Pouco antes do início da segunda divisão, o ge fez o Guia da Série B, em que dava notas em seis quesitos. Com peso maior para “elenco”, “momento” e “finanças”, a equipe tinha a nona maior pontuação, mas ainda era considerado candidato ao acesso.
Eis que começa a competição
No primeiro jogo, Botafogo e Vila Nova empataram em 1 a 1 em Goiânia com gol de Rafael Navarro e assistência de Chay. O camisa 14 – contratado depois do Estadual – entrou no segundo tempo para melhorar o time alvinegro que jogava com um a mais. Daquele time que começou jogando, só quatro foram titulares na partida contra o Brasil de Pelotas: Warley (que jogou de lateral), Kanu, Marco Antônio e Rafael Navarro.
A segunda rodada teve a primeira vitória do Botafogo na competição. No primeiro jogo no Nilton Santos, a equipe conseguiu três pontos em cima do Coritiba, tido como um concorrente direto na busca pelo acesso – o que se confirmou no fim, com as duas equipes lutando até o último domingo pelo título. A vitória por 2 a 0 – que teve Chay e Oyama como titulares pela primeira vez – deu moral para o time.
Já na terceira rodada, o Botafogo teve que se mudar. Com o Nilton Santos cedido para a realização da Copa América, o time atuou como mandante duas vezes em Volta Redonda e só voltou para casa diante do Cruzeiro. Para efeito de comparação, foram realizados cinco jogos como visitante, em que teve de ir para Londrina, Recife, São Luís, Florianópolis e Maceió. Além das viagens de avião, ainda tinha o deslocamenteo para a cidade que mandou suas partidas no período, e os treinos na Saferj, em Guaratiba, Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Ao fim da quinta rodada, com derrota para o então líder Náutico, o Botafogo ocupava a quarta posição, com oito pontos.
O desgaste cobrou seu preço. Dos sete jogos que fez nesse vai e vem, o Botafogo venceu dois (ambos no Raulino de Oliveira), empatou outros dois e perdeu três. A situação ficou extremamente delicada para Marcelo Chamusca. Com um jogo a menos e 12 pontos na tabela, o time parecia não encaixar na mêcanica desejada pelo treinador e começava a se aproximar perigosamente da zona de rebaixamento.
Apesar da fase não ser boa, havia um ponto positivo: Chay surpreendia e tomava conta do meio de campo alvinegro. Cada vez mais importante no time, o camisa 14 criava um protagonismo inesperado para parte da torcida, que estava ressabiada com o meia de 30 anos que chegara ao Botafogo após ótimo Carioca pela Portuguesa-RJ.
Ao mesmo tempo que buscava se entender dentro de campo, o Botafogo ainda precisava se manter viável financeiramente. Para isso, emprestou Sousa ao Cercle Brugge, da Bélgica, e vendeu PV para o Internacional, em uma transação criticada pelo baixo valor, mas que a diretoria afirmou ser necessária para atingir metas orçamentárias.
E então veio o jogo contra o Cruzeiro. Chay brilhou, fez três gols e só não viu o Botafogo sair do Nilton Santos com a vitória porque o adversário também marcou três vezes. O jogo ruim foi a gota d’água para a torcida, que não aguentava mais externar a revolta com o time apenas nas redes sociais.
Naquele momento, o Botafogo estava em oitavo lugar, com 15 pontos.
Com Marcelo Chamusca pressionado, membros de torcidas organizadas foram ao Nilton Santos para cobrar a demissão do técnico. A diretoria ficou em silêncio durante todo o dia, até que recebeu alguns torcedores dentro do estádio e uma parte foi conversar com os manifestantes. Por fim, no dia seguinte veio a demissão do treinador.
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Porém, a crise não terminara. O Botafogo tinha o plano A muito bem definido com Lisca, mas a diretoria não esperava a recusa do treinador. Em silêncio e sem dar qualquer satisfação para o torcedor por uma semana, o Botafogo divulgou a contratação de Enderson Moreira. Nesse meio tempo, duas derrotas para Brusque e Goiás deixaram o time mais próximo da zona de rebaixamento do que do G-4.
Se nos quatro jogos anteriores à chegada do atual treinador o Botafogo tinha três derrotas, Enderson conseguiu mudar muita coisa no time e, desde que assumiu, tem o mesmo número de reveses, mas num universo de 25 jogos.
O primeiro deles foi preocupante
A estreia de Enderson foi em Aracaju, contra o Confiança, então lanterna da competição. O Botafogo penou para vencer por 1 a 0 e talvez esse nem fosse o resultado mais justo da partida, já que o adversário teve o triplo de finalizações defendidas. Valeu o “saber sofrer” da equipe, que achou num chute de Romildo fora da área uma das vitórias mais difíceis da competição. A partida ainda contou com a expulsão do técnico que desrespeitou o quarto árbitro logo na estreia.00:00/00:00
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Infelizmente este vídeo não está mais disponível. Desculpe-nos pelo inconveniente.Enderson Moreira ofende quarto árbitro e é expulso
Depois dessa vitória o Botafogo engrenou. O time foi bem contra o CSA em partida atrasada pela sexta rodada e um jogador em específico chamou a atenção. Depois do 2 a 0 em cima do time alagoano, Rafael Navarro se tornou o jogador com mais participação em gols pelo Botafogo na temporada. Em meio ao imbróglio com a diretoria sobre renovação, cada partida bem jogada pelo atacante fazia o custo pela permanência aumentar um pouco mais.
Após o CSA, foi a vez do Vasco de Lisca ser a vítima. O time de Enderson Moreira, que voltara à beira do campo após cumprir suspensão, ganhou de 2 a 0, ouviu os alto-falantes do Nilton Santos tocarem “Vou Festejar” e viu a torcida rival dizer que era quase um crime o Botafogo ficar na frente.
O Botafogo chegava a 22 pontos, a quatro do G-4, em nono lugar.
A boa fase fez com que o time chegasse pela primeira vez na temporada a ter três vitórias seguidas. Após mais um triunfo em casa, diante da Ponte Preta, o Botafogo tropeçou diante do Operário-PR. Mas logo o time se ajustou e ficou sete partidas seguidas invicto, tendo empatado apenas uma delas. Foi no início dessa segunda série invicta de Enderson Moreira que o Bo viu ressurgir um pilar defensivo: Joel Carli.
O “capitán” atuou como titular pela primeira vez diante do Brasil de Pelotas no penúltimo jogo do primeiro turno. Diante da equipe gaúcha o argentino marcou o gol da vitória para garantir o 1 a 0 no Nilton Santos contra o lanterna da competição. O Botafogo viu que o experiente zagueiro poderia ser útil no restante da temporada e com ele em campo a quantidade de gols sofridos foi bem menor.
O Botafogo iniciou o returno com vitória sobre o Vila Nova, que o deixou em sexto lugar, com 32 pontos.
Três partidas depois, diante do Coritiba no Couto Pereira, o Botafogo entrava no G-4 pela primeira vez desde a chegada de Enderson. O 1 a 0 diante dos líderes da competição, na casa deles, fez com que o técnico visse que o time subiria para a primeira divisão, como disse em entrevista coletiva após o título no último domingo.
– Tive muita confiança que a gente ia conseguir o acesso – e falei isso no vestiário – no jogo contra o Coritiba. Estávamos enfrentando o líder do campeonato, nos seus domínios, e acho que tivemos uma atuação muito boa. Conseguimos controlar o jogo, impor dificuldades e dar poucas oportunidades de gol para o Corotiba. Fico feliz porque acho que aquele momento foi importante para todos. Eu relatei isso na conversa após o jogo. Fiquei muito feliz pelo resultado e falei que a gente estava caminhando muito bem.
Mesmo após a vitória que colocou o time no G-4, o Botafogo continuou reforçando o elenco para a disputa da Série B. No fim de agosto, o clube anunciava a contratação de Carlinhos e Luiz Henrique, emprestados do Fortaleza, e começava a negociar com o lateral-direito Rafael.
O ex-jogador do Manchester United foi a principal contratação do clube na temporada. Mesmo com pouco tempo em campo, o lateral teve importância interna, no dia a dia do elenco, e também na divulgação do Sócio-Torcedor do clube. A chegada do camisa 7 fez com que o Botafogo procurasse acordo com os jogadores que não vinham sendo utilizados para abrir espaço na folha salarial e assim chegar ao elenco que tem hoje.
“Torcedor dentro de campo”, como diz que seria, Rafael estreou com a camisa alvinegra justamente na primeira partida que teve a torcida presente no Nilton Santos. O duelo contra o Sampaio Corrêa marcou o retorno dos botafoguenses ao estádio desde o início da pandemia e só não foi melhor porque o lateral não deixou o dele, mas o Botafogo venceu mesmo assim.
Naquele momento, o time já era o vice-líder, com 48 pontos.
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Mas o segundo encontro em casa não foi bom. O Botafogo perdeu para o Avaí, com direito a Enderson Moreira discutindo com os torcedores enquanto a bola rolava. O mal entendido ficou para trás e desde aquele 2 de outubro o time não foi mais derrotado na Série B.
Até o acesso foram mais três empates e cinco vitórias – a mais emblemática antes da confirmação da subida foi a goleada por 4 a 0 em cima do Vasco e novamente uma provocação ao rival do Rio de Janeiro lembrando aquela marchinha de Carnaval “Ei, você aí…”.
Ao fim da 34ª rodada, o Botafogo assumiu pela primeira vez a liderança da Série B, com 62 pontos.
O jogo que confirmou a volta para a primeira divisão, no Nilton Santos lotado, não poderia ser sem emoção. A vitória de virada em cima do Operário foi para nenhum roteirista de documentário botar defeito. Fora de casa, contra o lanterna Brasil, o time foi além de qualquer expectativa e levantou a taça da Série B em Pelotas. Agora, a esperança é de um público ainda maior no próximo domingo, contra o Guarani, para celebrar o título da competição que o Botafogo espera nunca mais participar.
Por GloboEsporte – Rio de Janeiro