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Surpreendeu muita gente o pedido do subprocurador do TCU, para que os bens de Moro sejam bloqueados
Guerra interna movimenta investigação do TCU sobre Moro
Surpreendeu muita gente o pedido do subprocurador do TCU, Lucas Furtado, para que os bens de Sérgio Moro sejam bloqueados, no bojo da investigação do tribunal sobre o contrato entre o ex-juiz da Lava Jato e a consultoria Alvarez & Marsal.
Dias antes, o próprio Furtado havia pedido o arquivamento dessa mesma investigação, dizendo que o TCU não tem competência para investigar contratos privados.
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Agora, ele diz que encontrou “fatos novos” – a transferência de Moro para os Estados Unidos e inconsistências nos documentos apresentados pela consultoria que poderiam levar a alguma irregularidade fiscal – e que, por isso, é preciso bloquear os bens do juiz.
O relator do processo, o ministro Bruno Dantas, ainda não decidiu. Portanto, a a investigação continua.
E junto com ela, cresce uma guerra interna no TCU, com despachos desaforados e de acusações entre os procuradores: Furtado, que pediu a abertura da apuração, e Julio Marcelo de Oliveira, sorteado para atuar no processo.
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Até o ministro Dantas entrou na troca de farpas. E nos bastidores, a divisão entre favoráveis e os contrários à investigação sobre Moro alimenta intrigas e boatos.
Na sexta-feira, Furtado disse que o pedido de arquivamento era uma “estratégia” para tirar Oliveira do caso. “Ele queria entrar para blindar o Moro e toda a Lava Jato”, disse o subprocurador-geral por mensagem de WhatsApp.
Como pediu arquivamento, Furtado espera que o novo pedido dê origem a outra apuração – em que o rival não poderia mais atuar.
No início de janeiro, Oliveira acusou Furtado de extrapolar suas funções, atravessando ofícios e fazendo pedidos no processo em que ele atua, sem ter legitimidade para isso.
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Na acusação, feita à corregedoria do Ministério Público junto ao TCU, Oliveira argumentou que o regimento do tribunal determina que procurador que pede a abertura de uma investigação deve ser excluído do sorteio que escolhe quem vai acompanhá-la, para evitar conflito de interesses.
Oliveira, no caso, é o procurador sorteado. Mas Furtado, que admite em seus ofícios não ser o procurador natural do caso, mas continuou enviando pedidos.
No final de janeiro, Furtado revidou, e arguiu ao ministro Dantas a suspeição do colega por, segundo ele, ser amigo de Moro.
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No documento, anexou postagens de Oliveira em redes sociais em que ele aparece em fotos tiradas em eventos públicos com o ex-juiz e faz vários elogios a Moro.
Numa delas, publicada logo depois de Moro deixar o governo Bolsonaro, Oliveira diz que ele foi “um gigante que sempre se colocou a serviço do Brasil”.
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A cronologia do processo mostra que a briga dos procuradores só esquentaram depois que Moro se declarou pré-candidato à presidência da República pelo Podemos, em novembro passado.
Iniciada em março de 2021, para apurar eventual conflito de interesse na atuação do ex-juiz, andava lentamente. Em agosto, um parecer da unidade técnica recomendou seu arquivamento, alegando que o contrato não envolveu recursos públicos e portanto não poderia ser investigado pelo tribunal de contas.
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Só no final de dezembro Furtado pediu a Dantas que mandasse a Alvarez & Marsal dizer quanto havia pago a Moro.
No dia 7 de janeiro, antes que a resposta viesse, Julio Marcelo apresentou seu parecer endossando as conclusões da unidade técnica e recomendando o arquivamento do processo.
Em seguida, fez a representação em que acusa Furtado de extrapolar suas funções.
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Dias depois, o ministro Bruno Dantas rejeitou o parecer de Oliveira pelo arquivamento da ação, dizendo inclusive que o procurador não havia sido admitido por ele no processo.
Sem mencionar o fato de Oliveira ter sido sorteado, ele escreveu que não havia justificativa para haver dois procuradores atuando no caso, afirmou que o procurador estava tentando “causar tumulto processual” e cutucou: “enfatizo que simpatia pessoal ou convergência ideológica não se confundem com interesse público”.
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Foi quando Furtado revidou, pedindo a Dantas que arguisse a suspeição do rival.
No pedido, escreveu que “a relação amigável e de admiração entre o Sr. Júlio Marcelo e o ex-juiz Sérgio Moro é de conhecimento público”, e que isso “deveria impedir que este atuasse no processo em análise, em face da dúvida sobre sua imparcialidade e/ou independência”.
Dantas deu a Oliveira 15 dias para se manifestar. O prazo ainda está correndo, mas o procurador diz que não é amigo de Moro e que só se encontrou com ele em eventos de trabalho.
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O que o papel não registra, mas se ouve nos corredores do TCU, é que os partidários de Oliveira dizem que Furtado está num jogo combinado com Dantas, que é um notório crítico da Lava Jato e já conduz outros processos contra ela, para ganhar influência no tribunal e se tornar ministro.
Na ala que defende a apuração sobre Moro, não apenas Julio Marcelo Oliveira é tido como um “lavajatista”, como se diz que ele tem influência sobre os membros da unidade técnica que recomendaram o arquivamento do processo – algo que ele rechaça.
“Não tenho influência sobre os auditores e não conversei com ninguém da unidade técnica sobre esse processo ou qualquer outro. O que de fato existe é que eles me respeitam pela minha independência e trajetória profissional e eu os respeito muito.”
No dia 28 de janeiro, a Alvarez & Marsal apresentou ao TCU os contratos firmados com Sérgio Moro listando pagamentos de R$ 3,5 milhões de reais ao todo ao longo de 18 meses.
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Foi aí que Furtado pediu o arquivamento da investigação. Depois, mudou de ideia.
Além do bloqueio dos bens de Moro, o subprocurador-geral agora quer informações da Receita Federal que indiquem se o ex-juiz sonegou impostos ou mentiu para o fisco, enquanto Dantas espera que dados do setor de inteligência do TCU rastreie eventuais movimentações suspeitas.
Moro trabalhou para a Alvarez & Marsal de abril de 2020 a outubro de 2021. Tanto ele como a empresa afirmam que ele não atuou diretamente em nenhum processo que envolvesse empreiteiras.
No momento, é muito difícil prever no que vão dar as duas guerras – a interna e a investigação sobre Moro. Podem, inclusive não chegar a lugar nenhum. Mas certamente deixarão cicatrizes no tribunal de contas.
Por Malu Gaspar
OGlobo.globo.com