Esporte
A seleção brasileira terá desafio contra Angola
Ex-Flamengo, Paulistano e Joinville, ele assume o popular Atlético Petro de Luanda, atual campeão angolano, mas seguirá com trabalho à frente do Brasil
Técnico da seleção feminina, José Neto terá desafio em Angola em liga gerida pela NBA
Dono de vários títulos no comando do Flamengo, Paulistano e Joinville e campeão pan-americano de 2019 com a seleção brasileira feminina, o treinador José Neto está de malas prontas para Angola, no continente africano. O novo desafio da carreira do comandante de 49 anos é o time masculino do Atlético Petro de Luanda. Ele, contudo, não deixará o comando do Brasil. A exemplo do que fazem outros treinadores na modalidade, como Gregg Popovich, que é técnico do San Antonio Spurs na NBA e também da seleção dos Estados Unidos, o profissional vai trabalhar de forma concomitante com as duas equipes.
José Neto com a seleção brasileira em duelo contra a Colômbia — Foto: Divulgação/CBB
A suspensão das competições por conta da pandemia do novo coronavírus pesou nessa decisão, segundo o próprio Neto, em entrevista à reportagem do ge. Antes de fechar com a Confederação Brasileira de Basketball em maio de 2019, ele conta que deixou em aberto a possibilidade de treinar, simultaneamente, o time feminino do país e um clube. O momento certo chegou. A FIBA adiou os campeonatos internacionais de seleções, e as novas datas ainda não foram divulgadas, mas nada deve ocorrer antes de maio de 2021. Portanto, o comandante terá bastante tempo para implementar seu trabalho no time angolano.
– Quando fui falar com a CBB, pus essa possibilidade de fazer de forma concomitante. No começo, tive ofertas, mas não aceitei porque tínhamos uma sequência de quatro competições com a seleção em sete meses. Eu precisava implementar uma metodologia de trabalho. Me dediquei 100% à seleção para isso. Estava conhecendo o basquete feminino, nunca tinha trabalhado com basquete feminino e precisava entender a cultura. Fui no Maranhão, fui em Campinas ver as finais, acompanhei as seleções de base. Com os torneios adiados para o próximo ano, ainda estamos aguardando a confirmação de datas), mas não acontecerão antes de maio, além de já termos um trabalho mais solidificado com a comissão técnica e as jogadoras, achei saudável. Tenho a possibilidade de preparar meu trabalho e estar mais preparado – relatou ao ge.
O Petro é um dos clubes mais populares de Angola e um dos maiores vencedores do país. O maior objetivo da equipe é a disputa da BAL (Basketball African League), uma das competições mais importantes do continente, organizada em parceria pela NBA e a FIBA. O Petro de Luanda, que é o campeão nacional, será o representante de Angola. Além disso, tem uma equipe de futebol que é dona de 15 títulos do Girabola (campeonato angolano) e de 6 SuperTaças de Angola. Atualmente, está na vice-colocação do torneio nacional, atrás somente do rival 1º de Agosto. Isso, naturalmente, remete ao ano de 2012, quando José Neto assumiu o Flamengo.
– É uma equipe muito competitiva. É a atual campeã angolana (de basquete) e, curiosamente, quando comecei a pesquisar sobre Angola e sobre a equipe, vi que o basquete é mais popular que o futebol aqui. Foi bastante curioso saber disso. É uma equipe que tem muita cultura do futebol, tem um time de futebol que é um dos primeiros. Foi um atrativo. É um clube super popular. Na sondagem, ficou muita imprensa em cima, tem muito apelo o basquete lá. É um clube que gera uma expectativa. E, claro, poder falar a mesma língua é muito importante para poder passar a ideia. É um facilitador – disse o técnico, que foi apresentado em uma live no Facebook da equipe nesta quinta-feira.
O ex-técnico do Flamengo revela que teve conversas com um velho conhecido dos brasileiros, o dinamarquês Morten Soubak, que comanda o time de handebol do 1º de Agosto, rival do Petro, sobre o novo país. Ele também teve uma experiência parecida com a que Neto terá comandando uma seleção, na época, a feminina do Brasil de sua modalidade, e o Hypo Niederösterreich, time austríaco.
Além da língua, um dos grandes atrativos que fizeram com que José Neto fechasse com o Petro foi a oportunidade de disputar a BLA (Liga Africana), um campeonato gerido pela NBA em parceria com a FIBA África. Segundo ele, em toda a carreira, sempre buscou ver o que o caminho escolhido representava em um panorama maior.
– O Paulistano não era um clube competitivo e acabamos transformando nisso. Em Joinville, vi a oportunidade de dirigir meu primeiro time no NBB, mesmo com pouco investimento. Quando fui para o Flamengo, eles buscavam uma mudança de mentalidade e era a chance de trabalhar num grande clube. Quando fui para o Japão, vi a chance de estar num cenário internacional em um grande país, que está em desenvolvimento no basquete. Quando peguei a seleção, muita gente falava: “ah, você vai para o feminino”. Vi a chance de tirar o feminino de um cenário. Agora não é diferente: a África é um continente visado no basquete, sabemos o poderio físico deles, e a NBA tem um foco muito grande agora na África, como já teve em outros países, estão investindo nas competições porque veem muito potencial ali – relatou.
José Neto explicou que seu contrato com o Petro é de dois anos e, como costuma fazer, há uma cláusula de quebra, tanto por parte dele quanto por parte do clube, depois de um ano. Caso não seja de interesse de nenhum dos dois rescindir, é cumprido mais um ano. O comandante leva também Diego Falcão, preparador físico, que trabalha com ele há 14 anos. A esposa e o filho de 12 anos vão morar com ele em Luanda, e a filha de 22 ficará no Brasil por conta do trabalho.
José Neto com a taça do Mundial de Clubes que venceu pela equipe do Flamengo — Foto: Reprodução, Time Flamengo
No contrato, há também a previsão de duas viagens para o Brasil a cada período de um ano. De acordo com Neto, a direção do Petro vê com bons olhos o fato de ele conciliar o trabalho no clube com a função de comandante da seleção brasileira feminina. Estudioso, Neto já sabe o material humano que terá para trabalhar em Luanda e procura um jogador da posição número 5 para fortalecer o elenco.
– A equipe está formada, os jogadores estão com contrato vigente, mas teremos a inclusão de um jogador da posição 5 que estamos procurando ainda, que será um estrangeiro. Agora é lapidar a maneira de jogar. Fiquei bastante contente com as peças que temos. Elas se completam. Eu gosto de levar jogadores que tenho uma afinidade: quando vim para o Flamengo, veio o Shilton e Kojo. No Japão, levei o David Doblas, que acabou que ficou por lá. Estou procurando jogadores que eu conheça e que possam fazer essa função lá. Infelizmente, no Brasil, os jogadores que estiveram comigo nessa posição já estão recolocados – comentou.
Sobre a seleção brasileira, Neto crê que o caminho está traçado, que a metodologia de trabalho está implantada e espera agora colher frutos desse trabalho. Desde que assumiu em maio de 2019, conseguiu algumas mudanças claras no time feminino e bons resultados, como a medalha de ouro no Pan de Lima 2019 e o bronze na AmeriCup.
– Mudamos a maneira de jogar. Isso acabou trazendo resultados concretos positivos. A metodologia e maneira de jogar podem trazer coisas para nós. Agora vamos atrás delas. Por exemplo, classificar para as Olimpíadas e, não só isso, mas ter a chance de brigar pela medalha. Entendemos que conseguimos jogar e vamos aprimorar isso. Por isso que falamos de um processo de médio longo prazo. Implementado já está, agora é a execução. Teremos o Sul-Americano, o Pré-Mundial da América, depois o qualifying mundial para ir atrás da vaga no Mundial em 2022 na Austrália. Visamos, é claro, Paris 2024 – concluiu.
Por Gabriel Fricke — Rio de Janeiro, RJ / Globoesporte.globo.com