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Ao fim desta década, a economia brasileira vai ter colhido mais um indicador ruim

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Levantamento realizado pela FGV mostra que taxa de investimento deve recuar 2,2% ao ano, em média, entre 2011 e 2020. Incertezas sobre a trajetória da dívida pública e endividamento elevado das empresas são principais obstáculos para retomada.

Investimento no Brasil cairá na década pela 1ª vez desde os anos 80, aponta estudo

Ao fim desta década, a economia brasileira vai ter colhido mais um indicador ruim. Entre 2011 e 2020, os investimentos deverão ter registrado queda média de 2,2% ao ano, mostra levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).

Será a primeira queda do investimento para um período de dez anos desde 1980, conhecida como a década perdida.

O investimento é mais um dado que evidencia a fraqueza econômica do país na década atual. Outro levantamento do Ibre já apontou que o Produto Interno Bruto (PIB) do período de 2011 e 2020 será o pior dos últimos 120 anos, pelo menos.

Nos anos recentes, o fraco desempenho dos investimentos se concentrou de 2014 em diante, período a partir do qual a economia brasileira enfrentou uma dura recessão até 2016, observou um triênio de lenta recuperação e, agora em 2020, passou a ser impactada pela pandemia de coronavírus, que colocou o país novamente em recessão.

Fraco desempenho — Foto: Economia G1

Fraco desempenho — Foto: Economia G1

“O Brasil tem nos últimos 40 anos duas décadas perdidas, então isso explica o fato de o país estar com esse quadro de crescimento fraco”, diz Marcel Balassiano, pesquisador do Ibre/FGV e um dos autores do levantamento. O estudo também teve a participação dos economistas do Ibre Claudio Considera e Juliana Trece.

Para calcular o dado do investimento na década atual, o Ibre utilizou a projeção para o desempenho do investimento contida no relatório de inflação, do Banco Central. A expectativa é de queda de 6,6% neste ano.

Se não houvesse a crise provocada pela pandemia, o desempenho do investimento continuaria fraco. No relatório de inflação de dezembro do ano passado, portanto, antes de iniciada a pandemia, a expectativa era de alta de 4,1% para os investimentos, o que levaria a década atual a apresentar uma queda média de 1,2%.

“O coronavírus agravou uma situação. Mas sem a doença, o Brasil continuaria com esse problema (de fraco investimento)”, afirma Juliana.

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Incertezas travam investimentos

A taxa de investimentos é medida pela Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), que apura tudo o que se investe em máquinas, bens duráveis, aumento da capacidade produtiva e construção civil.

O avanço deste componente do PIB é fundamental para que o país consiga colher um crescimento mais sustentável e robusto ao longo dos próximos anos e, assim, aumentar a riqueza da sua população, afirmam os economistas. Mas desde 1980, o avanço médio da taxa investimento no país é de apenas 0,5% ao ano.

“O Brasil tomou a decisão de ficar parado, não tomou a decisão de crescer, de distribuir renda”, diz Considera. “O país ficou três anos crescendo 1% ao ano, é praticamente o avanço da população. É renda per capita crescendo zero.”

Mais do que um retrovisor fraco, há uma dúvida sobre se o Brasil vai ser capaz de recuperar a força dos investimentos no futuro.

O país lida com uma série de incertezas. A maior delas está na área fiscal. Com a pandemia, o endividamento do governo deve se aproximar de 100% do PIB neste ano, um patamar considerado alta para uma economia emergente como a brasileira.

A principal dúvida na área fiscal é se o governo vai manter o teto de gastos, que limita o crescimento das despesas à inflação do ano anterior. Na leitura do mercado, uma eventual deterioração das contas públicas pode levar a uma fuga de investidores do país, o que provocaria uma depreciação do câmbio e um consequente aumento da taxa básica de juros – hoje em 2% ao ano.

Juros mais altos encarecem a tomada de crédito pelas empresas para realizar novos investimentos.

“Existe o receio de que a trajetória da dívida pública cause ainda mais problemas”, diz Considera. “Não cumprir o teto traz muita insegurança para os investidores. E a situação do capital externo, que está mais saindo do que entrando, pode se agravar ainda mais.”

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Há ainda uma agenda longa e já antiga de reformas estruturais que o Brasil precisa endereçar, como a tributária, para melhorar o ambiente de negócios. “As reformas são na direção de atrair investimentos. É fundamental que sejam realizadas”, afirma Considera.

Empresas endividadas

Além de provocar uma piora do cenário macro, a pandemia afetou a saúde financeira das maiores empresas do Brasil, com o aumento do endividamento, o que também se torna um empecilho para a retomada dos investimentos.

No primeiro semestre, a relação entre endividamento líquido sobre capital próprio das companhias chegou a 73,5%, segundo levantamento do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Isso quer dizer que, para cada R$ 1 em dinheiro dos sócios, as empresas têm quase R$ 0,74 em financiamentos.

No primeiro semestre de 2019, essa relação era de 58,7%.

Mais dívida — Foto: Economia G1

Mais dívida — Foto: Economia G1

“Esse é um quadro que dificulta muito o investimento. É preciso lembrar que são duas crises próximas e que já houve um bom aumento do endividamento das empresas na crise anterior” , afirma o economista-chefe do Iedi, Rafael Cagnin. “A primeira onda de endividamento ainda não tinha sido totalmente digerida pelas empresas.”

O levantamento do Iedi foi realizado com 240 empresas não-financeiras

Influência dos juros e de leilões de infraestrutura

A retomada dos investimentos no país passa pelo cenário de juros baixos – o que reforça a necessidade de acerto das contas públicas – e pela retomada dos leilões de infraestrutura.

Na última recessão, entre o fim de 2014 e 2016, o cenário para a melhora dos investimentos era considerado até mais difícil, avalia o diretor do ASA Investments, Carlos Kawall. Naquela ocasião, os juros estavam mais altos e a Operação Lava Jato provocava estragos econômicos em boas parte das maiores construtoras do país.

“A taxa de juros a 2% está ajudando numa retomada imobiliária, por exemplo”, diz Kawall. “O financiamento imobiliário é um das poucas modalidades (de crédito) que sofreu pouco ou quase não sofreu com a crise e logo se recuperou.”

Desde que assumiu, a equipe econômica sempre defendeu que a participação da iniciativa privada deveria liderar a retomada dos investimentos em infraestrutura no país. Mas, em quase dois anos, o governo conseguiu tirar pouca coisa do papel.

Em janeiro deste ano, a equipe econômica esperava leiloar ao menos seis estatais.

“O cenário é bom para a infraestrutura. A retomada dos leilões se dá em outra base (em relação ao governo Dilma). Dessa vez, com a atratividade adequada”, afirma Kawall. “O único problema é que se trata de um processo lento, na medida em que toda a parte regulatória é demorada.”

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Por Luiz Guilherme Gerbelli, G1

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